ESPACO RESERVADO PARA AS ARTES EM GERAL (incluindo cultura inútil) E CULINÁRIA

MECENAS

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

FALANDO "MINEIRÊS"



O sotaque dos mineiros
Por Terezinha Pereira
O sotaque dos mineiros deveria ser ilegal ou imoral. Porque, se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar lindo dos mineiros ficou de fora? Porque, Deus, que sotaque!
Mineiro deveria nascer com tarja preta avisando: ouvi-lo faz mal à saúde. Se um mineiro, falando mansinho, me pedir para assinar um contrato doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: só isso? Assino achando que ele me faz um favor. Eu sou suspeitíssimo. Confesso: esse sotaque me desarma..
Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas. Preferem abandoná-las no meio do caminho (não dizem: pode parar, dizem: “pó parar”. Não dizem: onde eu estou?, dizem: “ôncôtô”. Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem lingüisticamente falando – apenas de uais, trens e sôs. Digo-lhes que não.
Mineiro não fala que o sujeito é competente em tal ou qual atividade. Fala que ele é “bom de sirviço”. Pouco importa que seja um juiz ou jogador de futebol. Mineiras não usam o famosíssimo “tudo bem”. Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra: -
“Cê tá boa?”.
Para mim, isso é pleonasmo. Perguntar para uma mineira se ela tá boa é desnecessário. Há outras. Vamos supor que você esteja tendo um caso com uma mulher casada. Um amigo seu, se for mineiro, vai chegar e dizer:
- “Mexe” com isso não, sô (leia-se: sai dessa, é fria, etc.).
O verbo “mexer”, para os mineiros, tem os mais amplos significados. Quer dizer, por exemplo, trabalhar. Se lhe perguntarem com o que você mexe, não fique ofendido.
Querem saber o seu ofício. Os mineiros também não gostam do verbo conseguir. Aqui ninguém consegue nada. Você não dá conta. “Sôcê” (se você) acha que não vai
chegar a tempo, você liga e diz:
- “Aqui”, num vô dá conta de chegá na hora, não, “sô”.
Esse “aqui” é outro que só tem aqui. É antecedente obrigatório, sob pena de punição pública, de qualquer frase. É mais usada, no entanto, quando você quer falar e não estão lhe dando muita atenção. É uma forma de dizer:
- Olá, me escutem, por favor. É a última instância antes de jogar um pão de queijo na cabeça do interlocutor. Mineiros também não dizem apaixonado por. Dizem, sabe-se lá por que, “apaixonado com”. Soa engraçado aos ouvidos forasteiros. Ouve-se a toda hora: – Ah, eu apaixonei “com” ele… Ou:
_Sou doida “com” ele (ele, no caso, pode ser você, um carro, um cachorro).Elas
vivem apaixonadas com alguma coisa.
Que os mineiros não acabam as palavras, todo mundo sabe. É um tal de “bunitim”, “fechadim”, “cupim” ( em vez de copinho), “PURQUIM”EM VEZ DE PORQUINHO, e por aí vai. Já me acostumei a ouvir:
- E aí, “vão?”.
Traduzo:
- E aí, vamos?. Não caia na besteira de esperar um “vamos” completo de uma mineira. Não ouvirá nunca. Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira. Nada pessoal. Aqui certas regras não entram.
São barradas pelas montanhas. Por exemplo, em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer: – Eu preciso “de” ir. Onde os mineiros arrumaram esse “de”, aí no meio, é uma boa pergunta. Só não me perguntem. Mas que ele existe, existe. Asseguro que sim, com escritura lavrada em cartório. Deixa eu repetir, porque é importante. Aqui em Minas ninguém precisa ir a lugar nenhum. Entendam… Você não
precisa ir, você precisa “de” ir. Você não precisa viajar, você precisa “de” viajar. Se você chamar sua filha para acompanhá-la ao supermercado, ela reclamará:
- Ah, mãe, eu preciso “de” ir?
No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra um “tanto de coisa”. O supermercado não estará lotado, ele terá um “tanto de gente”. Se a fila do caixa não anda, é porque está “agarrando” lá na frente. Entendeu? Agarrar é agarrar, ora! Se, saindo do supermercado, a mineirinha vir um mendigo e ficar com pena, suspirará:
- “Ai, gente, que dó”.
É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelos mineiros. Não vem “caçar confusão” pro meu lado. Porque devo dizer, mineiro não arruma briga, mineiro “caça confusão”. Se você quiser dizer que tal sujeito é arruaceiro, é melhor falar, para se fazer entendido, que ele “vive caçando confusão”. Para um mineiro falar que algo é muitíssimo bom vai dizer:
- “Ô, é sem noção”. Entendeu? É “sem noção”! Só não esqueça, por favor, o “Ô” no começo, porque sem ele não dá para dar noção do tanto que algo é sem noção, entendeu? Capaz… Se você propõe algo ela diz:
- “Capaz” !!! Vocês já ouviram esse “capaz”? É lindo. Quer dizer o quê? Sei lá, quer dizer “ce acha que eu faço isso”!? Com algumas toneladas de ironia… Se você ameaçar casar com a Gisele Bundchen, ela dirá:
-”Ô dó dôcê”. Entendeu? Não? Deixa para lá. É parecido com o “nem…”. Já ouviu o “nem…”? Completo ele fica:
- Ah, “neeeem”… O que significa? Significa, amigo leitor, que o mineiro que o pronunciou não fará o que você propôs de jeito nenhum. Mas de jeito nenhum. Você diz:
- Meu amor, “cê” anima “de” comer um tropeiro no Mineirão?
Resposta:
- “Neeeem….”. Não vai de jeito nenhum! Ainda não entendeu? Uai, nem é nem.
A propósito, um mineiro não pergunta: – Você não vai?. A pergunta, mineiramente falando, seria: – “Cê” não anima “de” ir? Tão simples. O resto do Brasil complica tudo. É, ué, cês dão umas volta pra falar os trem…
Falando em “ei…”. As mineiras falam assim, usando, curiosamente, o “ei” no lugar do “oi”. Você liga, e elas atendem lindamente:
- “Eiiii!!!”, com muitos pontos de exclamação, a depender da saudade…
Há tantos outros… O plural, então, é um problema. Um lindo problema, mas um problema. Elas chegam onde tem um tantão de gente junta e dizem “Eeeeeiss!”
Sou, não nego, suspeito. Minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras. Aliás, deslizes nada. Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão. Se você, em conversa, falar:
- Ah, fui lá comprar umas coisas… ?
- “Que’ s coisa”? – ela retrucará. O plural dá um pulo. Sai das coisas e vai para o que. Ouvi de uma menina culta um “pelas metade”, no lugar de “pela metade”. E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa, confidenciará:
- Ele pôs a culpa “ni mim”. A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios, em Minas.
Ontem, uma senhora docemente me consolou: “preocupa não, bobo!”. E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras, nem se espantam. Talvez se espantassem se ouvissem um: “não se preocupe”, ou algo assim. A fórmula mineira é sintética. E diz tudo.
Até o tchau, em Minas, é personalizado. Ninguém diz tchau pura e simplesmente. Aqui se diz: “tchau pro cê”, “tchau pro cês”. É útil deixar claro o destinatário do tchau.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

sábado, 21 de agosto de 2010

QUINTAL MINEIRO

Aquarela sobre papel (20x30cm), R. Meneghini 1998

 

SER MINEIRO (Fernando Sabino)

"Ser mineiro é não dizer o

que faz , nem o que vai fazer ,

é fingir que não sabe aquilo

que sabe , é falar pouco e

escutar muito , é passar por

bobo e ser inteligente , é

vender queijos e possuir

bancos .

Um bom mineiro não laça

boi com imbira , não dá

rasteira no vento , não pisa

no escuro , não anda no

molhado , não estica

conversa com estranhos , só

acredita na fumaça quando

vê fogo , só arrisca quando

tem certeza , não troca um

pássaro na mão por

dois voando .

Ser mineiro é dizer "uai" ,

é ser diferente , é ter marca

registrada , é ter história .

Ser mineiro é ter

simplicidade e pureza ,

humildade e modéstia ,

coragem e bravura ,

fidalguia e elegância .

Ser mineiro é ver o nascer

do sol e o brilhar da lua ,

é ouvir o cantar dos pássaros

e o mugir do gado , é sentir

o despertar do tempo e o

amanhecer da vida . Ser

mineiro é ser religioso e

conservador , é cultivar as

letras e artes é ser poeta e

literato , é gostar de política ,

é amar a liberdade , é viver nas

montanhas , é ter a vida interior ,

é ser gente " .

A ARTE DE ROBERTO MENEGHINI - UM TEXTO DE GERALDO SANTOS PEREIRA (Jornalista, Escritor e Cineasta)

Roberto Meneghini Salgarello, que se assina, artisticamente, R. Meneghini, nasceu em Albuquerque, Novo México, nos Estados Unidos, em 01 de agosto de 1966, mas é brasileiro por sangue, amor, identidade e vocação.

Engenheiro eletricista, formado pelo CEFET-MG, especialista em Administração de Marketing pela FUMEC-MG, adquiriu experiência de publicidade, ao iniciar sua carreira como Lay outista e Arte finalista em agências de propaganda, além de ter sido desenhista de camisetas. Também trabalhou em gráficas e empresas jornalísticas de grande circulação como o "Estado de Minas" e "Folha de São Paulo".

Estes dados biográficos são importantes para se conhecer a formação profissional de um artista. Mais importante, contudo, é aferir-se seu ingresso na vida artística, sua intimidade com a pintura e, principalmente, as influências e os caminhos que o levaram ao amadurecimento técnico e criativo.

R. Meneghini começou a pintar óleo sobre tela aos 13 anos. Por volta de 1991-1992, estudou e trabalhou com Selma Weissmann, realizando obras em acrílico sobre tela e papel texturizado. De 1992 a 1996 pintou mais óleo sobre tela sob a orientação de seus mestres Euclides e Marcelo Bottaro. Nos dias atuais, confessou-nos o pintor, está aglutinando estas experiências e investindo em uma nova técnica, a aquarela.

Perguntamos a Roberto quais suas maiores admirações no mundo da pintura. Ele não hesitou e colocou em, primeiro lugar, Van Gogh e, em seguida, os mestres do Impressionismo, como Monet, Modigliani, Renoir, Matisse e outros mais como o cubista Pablo Picasso.

- E entre o s brasileiros?- quisemos saber.

E Roberto Não hesitou em indicar Juarez Machado, Portinari, Inimá, Iara Tupinambá.

Depois do aprendizado vieram na vida de Roberto a experimentação, a busca de caminhos próprios e do estilo, o trabalho, principalmente o trabalho, pois é sempre através dele que o artista encontra a essência de sua arte e adquire os meios técnicos para "revelar pelo visível o invisível" e exprimir na tela o que vê, se emociona, inventa e imagina. E é sempre pelo trabalho, com diz Fléxa Ribeiro, que o artista apreende os dois sentidos as forma: "a externa, que é estática, e a interna, que é dinâmica, qualitativa, e que gerada daquele movimento, dá pelo modelado interno a sensação de vida àquela unidade inerte".

O respeitado autor de "História Crítica da Arte" ensina também que "pela luz e pela cor, o movimento faz nascer a forma. Com tal conteúdo, o corpo se define pelas linhas que o limitam. E pelo modelado, nas aparências irreais, luminosas e crômicas, a expressão aparece inatingível, impalpável, mas real."

"O artista – escreve Pierre Poirier – pelo golpe de olhar, entra em contato direto com o objeto e nos fornece os elementos recompostos da sensação visual". Roberto Meneghini, além da sensação ótica que sua obra instiga, também nos sugere o amor da vida, o combate da matéria e do espírito, tornando tangível pelo realismo do desenho e o calor do colorido". Dürer observa que Van Eyck criava uma pintura "inteligente", sabendo que o realismo é o caminho do espírito". E este caminho também é trilhado por Meneghini.

Na obra já realizada por nosso jovem pintor observa-se igualmente uma busca incessante de expressão plástica, tanto no inanimado, como o da realidade que se modifica constantemente no tempo e no espaço. Quando se observa um vaso de flores, que Roberto pinta com grande beleza, não se pensa em "natureza morta", mas em coisa viva, bela, de realidade transfigurada.

Vendo e apreciando os quadros de R. Meneghini, o público, que ele vai conquistando a cada exposição que realiza, empreende esta "viagem miraculosa da treva para a luz, e da luz para a treva", lembrada por Fléxa Ribeiro.

As anos de trabalho com José Euclides Bottaro conduziram Meneghini para o Impressionismo e os caminhos do antiacademicismo e o inconformismo, aguçando-lhe a sensibilidade frente a natureza e ao modelado humano, lembrando Monet, que se definia como um pintor que "pinta como os pássaros cantam". Mas não só a natureza inspira e perturba Roberto Meneghini . Também o corpo, o rosto humano, com suas expressões, o olhar de sofrimento e mistério, as grandes e pequenas alegrias encontram-se na obra de nosso pintor que, além de pintor, e um excelente pintor, é também um pensador que se exprime através da arte.

Geraldo Santos Pereira (em abril de 1997)